sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Vida, Comboio, 8 de Outubro de 2010

A vida dá voltas, enrola-se, dobra-se, desdobra-se. Estica, encolhe. Foge.
Agora que dou por mim a ver-lhe o fim antecipado, vejo, percebo (com olhos de perceber).
tenho a tendência de olhar para trás, para o que foi, para o que fiz, como se isso fosse toda uma grande história. Uma parva nostalgia de 20 anos, é tudo. quando afinal o que vivi até agora foi apenas um ensaio para o verdadeiro mundo.
É uma vida que o foi e não o foi. Tudo o que fiz, e faço ainda, não foi senão uma base, uma antecipação, um estágio.
Estudei para aprender o que é o trabalho, trabalhei para aprender o que me espera num trabalho a sério, fiz um curso para descobrir que não me ensinou nada, nada como a rua, nada. O que sofri foi só uma amostra do sofrimento que me espera ainda, e não para me assassinar.
O que amei, bem o que amei não me ensinou nada para futuro amor, ponto.
As amizades e laços que criei foram para testar flexibilidades, e para garantir que quando o sofrimento real vier, terei alguém para me amparar.
As pessoas que deixei para trás e que perdi mostraram-me a dor da perda e da saudade que acumularei até ao fim.

Hoje tive uma revelação. A longa vida que julgo ter tido já, nem vida, muito menos longa, foi. Estes 20 anos andei apenas a preparar-me para os próximos 60. E acho que estou bem preparada. Não sei é quando começam esses novos anos a sério, mas venham.
Agora, não vou achar mais que toda a diversão que se tem numa existência tem que ser vivida neste estágio, muito pelo contrário, e tal como o mau, o bom que passei não se compara em nada ao que que ainda me falta passar. E por isso não vou mais ter pressa de viver.
A vida virá, com tudo, com a força toda, o livro vai ainda no prefácio, ainda está todo por escrever, até aqui sou só um rascunho.
Então, quero ter já a sabedoria que se costuma atingir já no fim do livro, quero ter aprendido a lição, já no início, para ser mais útil.
É que o que construo nesta viagem é só meu, sou sozinha e sou única e não me vou nunca preocupar com o que os outros pensem (dentro dos limites da razão que me orgulho de ter). E vou fazer o que eu quiser.
Hoje vou calçar os saltos altos, sem medo de dores, vou-me maquilhar, para estar bonita para o ecrã que me encara todo o dia. Vou chegar atrasada. Vou andar de comboio pelos subúrbios à noite.

Vou viver. Porque não sei se vou chegar a viver a vida para a qual me preparei. não sei sequer se ela já começou e não me avisaram, se já é a sério, se sempre foi.
Estou cá e vou existir. vou Estar.
Existam também. Estejam.

Sem comentários: